segunda-feira, 30 de novembro de 2009

O calote institucionalizado.


Caros leitores,

Fugindo do tema que vínhamos abordando, sobre questões relacionadas aos condomínios, esse mês peço licença aos senhores e senhoras para tratar de um assunto muito sério: o calote das dívidas públicas estaduais e municipais que está sendo instituído pela chamada “PEC do calote dos precatórios” (Proposta de Emenda à Constituição), que no dia 25/11 foi aprovada pelo Plenário da Câmara dos Deputados por 338 votos contra 77 e 7 abstenções, e agora deverá seguir para o Senado Federal para ser votada em dois turnos.

Acredito que muitos já ouviram falar sobre precatórios, que nada mais são do que títulos da dívida pública. Esses títulos (precatórios) são emitidos na maioria das vezes após uma longa discussão judicial, quando o Poder Público (União, Estados ou Municípios) é condenado a pagar determinado valor a alguém. A União, de fato, mantém em dia os pagamentos da dívida pública, mas os Estados e Municípios retardam ao máximo esse pagamento, podendo ficar até 10 anos ou mais sem pagar àquilo que foram condenados judicialmente, praticamente forçando o titular daquele crédito a negociá-lo no chamado “mercado paralelo” com deságios que podem chegar a 70% do valor devido.

Para quem adquire o precatório é um excelente negócio porque existe a possibilidade de se compensar uma dívida por àquele crédito. Exemplo: uma empresa deve um milhão de reais de IPTU e adquire um precatório desse valor com deságio de 50% ou mais, e garante àquela dívida municipal com o título da dívida pública municipal (precatório municipal) adquirido a um preço muito menor do que o devido. Em resumo: paga-se a dívida desembolsando muito menos.

Mas se para as empresas de forma geral adquirir precatórios é um excelente negócio, o que dizer daquela pessoa que amargou anos esperando a sonolenta justiça julgar seu caso e quando acha que vai receber o valor que a própria justiça estipulou na sentença é remetido para uma fila interminável de pagamento e lá é forçado a aguardar mais vários anos sem saber ao certo quando poderá sacar seu crédito? Não é raro o titular do direito morrer sem ver a cor do dinheiro!

Pois bem, senhoras e senhores, se dessa forma já é repugnante conviver com tamanha falta de respeito e afronta ao Poder Judiciário, que inclusive já determinou o pagamento da dívida em ordem cronológica, com a aprovação da PEC 351/09, que irá alterar o artigo 100 da Constituição Federal e acrescentar o art. 97 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, Estados e Municípios poderão fazer leilão no qual o credor (àquele que litigou durante anos contra o poder público) poderá propor descontos para receber o dinheiro sem seguir a ordem de emissão dos precatórios (!).

Sem medo de errar, ouso dizer que caso realmente a famigerada PEC seja definitivamente aprovada no Senado, o Brasil estará oficializando o maior calote público-financeiro já visto no País! Verdadeiro absurdo e uma aberração jurídica porque vai de encontro aos pilares de sustentação do estado democrático de direito e que, segundo o Dr. Cezar Brito, que é o presidente nacional da OAB, constitui “o maior atentado já perpetrado à democracia desde a ditadura militar”.

É o Estado fazendo valer àquela velha máxima popular de que “devo não nego, pagarei quando puder”, mas o problema é que esse ditado estará sendo aplicado contra decisão judicial.

Com diz Boris Casoy: “Isso é uma vergonha”!

Na próxima edição votaremos a falar sobre os reflexos no mundo jurídico das relações condominiais. Até breve!

Marcus Soares
ARF Advogados Associados
Membro da Comissão de Defesa do Consumidor
Membro da Comissão de Defesa dos Credores Públicos – Precatórios
Ordem dos Advogados do Brasil – 57ª Subseção - Barra da Tijuca.
Tel,: 21- 2492-4064.